Energia e Mobilidade
Algarve: nova vaga de projetos eólicos e solares ameaça biodiversidade
Data
29
Julho
2025
Autor
Autor:
GEOTA

A Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves (SPEA) está a acompanhar com preocupação o aumento de projetos de energia renovável (particularmente centrais solares e parques eólicos) em zonas ecologicamente sensíveis, frequentemente suportados por Estudos de Impacte Ambiental (EIA) desajustados e deficitários, em desconformidade com as boas práticas de Avaliação de Impacte Ambiental e com a legislação nacional e comunitária de conservação da natureza.

As aves planadoras, em particular as aves de rapina, são dos grupos mais diretamente afetados pela colisão com aerogeradores e/ou pela colisão e/ou eletrocussão com as linhas elétricas, devido ao seu comportamento de voo, elevada longevidade e baixa produtividade. A mortalidade nestas infraestruturas pode afetar populações já fragilizadas, sobretudo quando os projetos são instalados nas suas áreas de reprodução, alimentação ou dispersão/migração.

Atualmente estão em avaliação de impacte ambiental vários projetos com forte impacto territorial e ecológico para o interior do Algarve, nomeadamente: Projeto de Hibridização da Central Fotovoltaica de Alcoutim (Solara4); Projetos Eólicos de Hibridização das Centrais Fotovoltaicas de Viçoso, Pereiro, São Marcos e Albercas; Central Solar Fotovoltaica do Pereiro e respetiva linha de muito alta tensão; Parque Eólico de Silves e Parque Eólico de Cachopo. Somando os projetos em análise e já operacionais, prevê-se a instalação de 110 aerogeradores numa área de cerca de 500 km², sem uma abordagem territorial integrada, comprometendo a sustentabilidade ecológica da região.

“A transição energética não pode ser feita à custa da biodiversidade. A forma como estes projetos estão a ser planeados compromete décadas de esforço na conservação de espécies emblemáticas e o seu futuro”, afirma Rita Ferreira, Técnica Sénior de Conservação.


Projetos em avaliação colocam em causa áreas importantes para as aves

A SPEA alerta para o risco da instalação massiva destes projetos no nordeste algarvio – uma região crucial para a conservação de espécies ameaçadas e protegidas pela legislação nacional e europeia como a águia-de-Bonelli (que aqui tem o seu principal núcleo reprodutor do país), a águia-imperial-ibérica * (classificada como Criticamente em Perigo), a águia-real e o grifo, que utiliza o importante corredor de dispersão e migração de aves que atravessa as serras algarvias. Todas as áreas de dependência destas espécies durante as várias fases do seu ciclo de vida estão protegidas pela legislação.


As lacunas graves dos processos de avaliação de impacte ambiental

A SPEA alerta ainda para as fragilidades dos EIA, nomeadamente destes projetos de hibridização, os quais apresentam falhas graves, como a ausência de estudo de alternativas de localização, análise insuficiente dos padrões de voo e uso do espaço pelas aves planadoras, subestimação do risco de perturbação dos casais reprodutores e do risco de colisão, e a subvalorização dos impactes cumulativos. Ambos os projetos preveem aerogeradores a apenas 1 km de ninhos ativos de águia-de-Bonelli e de águia-imperial- ibérica*, sem analisar os seus efeitos no abandono do território e na dinâmica populacional a nível regional, nacional e ibérico.


O primeiro passo deve ser evitar a mortalidade

O Parque Eólico do Malhanito, com 29 aerogeradores, situa-se no corredor de dispersão e migração do nordeste algarvio, próximo dos projetos agora em avaliação. Segundo o Relatório Final da Monitorização de Aves e Quirópteros (Bioinsight 2016), entre 2013 e 2016, foram registadas 8 mortes de grifos, com estimativas corrigidas de 9 a 10 por ano. Implantado em zonas de vales encaixados e cumeadas que originam correntes orográficas e térmicas que concentram o movimento das aves planadoras, o parque expõe-nas a um elevado risco de colisão – um impacto evitável mediante uma ponderação mais criteriosa da localização do projeto. Apesar disso, os EIA dos projetos em análise para áreas adjacentes, como o Solara4, ignoraram estas evidências.

Para minimizar a mortalidade por colisão com aerogeradores, os EIA propõem como medida central a instalação de sistemas automáticos de deteção e paragem de avifauna (ADS), baseados em vídeo e inteligência artificial. Estes sistemas, pouco testados e de eficácia incerta, não podem justificar a instalação de aerogeradores em zonas ecologicamente inadequadas – violam o princípio da hierarquia de mitigação previsto na legislação europeia, que primeiramente exige evitar e só depois minimizar e compensar.


A posição da SPEA

A SPEA defende que projetos localizados em áreas ecologicamente sensíveis, fundamentais para a conservação de espécies protegidas e ameaçadas – como é o caso do nordeste algarvio – não devem ser viabilizados. A transição energética é essencial, mas deve assentar em Avaliações de Impacte Ambiental idóneas e robustas, que assegurem o cumprimento da legislação ambiental e a salvaguarda da biodiversidade. A ausência de alternativas viáveis, a pressão para licenciamentos rápidos e a desvalorização dos impactes sobre o património natural comprometem a credibilidade e a confiança nestes processos. Os projetos devem ser compatíveis com os valores ecológicos dos territóriosem que se inserem e não impostos a comunidades e ecossistemas já vulneráveis. Compete à Administração Pública garantir a aplicação do princípio da precaução, a avaliação rigorosa de alternativas e a transparência institucional, garantindo que o interesse público prevalece sobre interesses económicos de curto prazo.

A SPEA continuará a exigir que a transição energética em Portugal seja compatível com a conservação da biodiversidade e os compromissos nacionais e europeus em matéria ambiental.


As organizações Fapas, GEOTA, Liga para a Proteção da Natureza, Quercus e WWF Portugal, juntam-se a este apelo e subscrevem este comunicado.

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