2025
No âmbito do procedimento de consulta pública do Projeto de Desflorestação da Área 1A3 da Zona Industrial e Logística de Sines (ZILS), o GEOTA - Grupo de Estudos de Ordenamento do Território e Ambiente - apresenta discordâncias de caráter geral com o projeto.
Os principais pontos a assinalar são os seguintes:
Não devem ser permitidas o corte de árvores, sobretudo sobreiros, para a produção de energia solar. Existem alternativas que podem e devem ser utilizadas, nomeadamente a utilização de áreas já artificializadas.
Contrapartidas / Mitigação. Caso o projecto avance, deve ser feito uma alteração do projecto de forma a preservar a maioria do montado existente e da flora com estatuto de proteção.
Não deve ser permitido o corte de sobreiros para a produção de energia solar
a) O GEOTA critica a decisão de se cortarem árvores em número tão excessivo, no caso em estudo vão ser cortadas 14890 árvores (EIA), incluindo sobreiros -2475 -.
Qualquer árvore tem valor, mas especificamente o sobreiro é uma árvore protegida por lei. O montado é um Habitat protegido pela Directiva 9330 e é um habitat raro e em franca regressão em Portugal e devem ser exercidos grandes esforços públicos à sua preservação. Trata-se de um ecossistema diverso e muito rico e deve ser sempre preservado, mesmo quando se trata de sobreiros jovens, como é alegado como desculpa no EIA para alguns dos exemplares.
Infelizmente a proteção do montado não é o que se tem verificado em Portugal na última década, aliás o montado tem sofrido inúmeras ameaças. Uma errada política ambiental e de ordenamento do território tem sistematicamente aberto excepções à proibição. Mas o Estado tem a obrigação de cumprir a lei e de defender o seu território e a biodiversidade.
E quando se utilizam os objetivos das metas de descarbonização da economia e de combate às alterações climáticas para justificar o derrube de árvores, ainda torna o caso mais patológico. É uma visão distorcida. Não deveria haver conflito entre a transição energética e a preservação da floresta. A árvore tem um papel fundamental como sumidouro de carbono.
b) As centrais solares devem ocupar áreas já artificializadas, existe no país muita capacidade de áreas artificializadas e industrializadas para a instalação de centrais solares, não sendo necessário ocupar áreas de floresta para este efeito. Por exemplo, a capacidade solar prevista pode ser instalada nos próprios edifícios industriais já existentes ou em construção, bem como em zonas de estacionamento e noutros edifícios na proximidade.
Contrapartidas / Medidas de Conservação
Na eventualidade de o projeto avançar, o GEOTA defende que deve ser protegida ao máximo o montado e que uma parte maior da Área 1A3 da Zona Industrial e Logística de Sines (ZILS) em que existe floresta de montado deve ser preservada. Assim como deve ser protegida a flora identificada como espécie protegida RELAPE.
Do projeto deve ser alterado no sentido de preservar o maior número possível de árvores
Argumentos para a preservação do montado e da flora naquela zona:
a) Clima - As árvores, sobretudo em floresta como é aqui o caso, são importantes na regulação do clima da região e na descida da temperatura. Numa zona como a área em estudo, Sines no Alentejo, que já sofre problemas de aumento das temperaturas médias, desertificação e falta de água, deve ser evitado qualquer corte de árvore porque estas são fundamentais para a descida de temperatura e para o ciclo da água.
b) Água - Como é referido no EIA, existem dois níveis de aquífero naquela área, um mais profundo e outro mais superior. A recarga dos aquíferos é feita através de infiltração direta e as árvores têm um papel fundamental na alimentação dos aquíferos. O corte deste número muito excessivo de árvores vai reduzir a infiltração de água.
E a implementação de painéis solares também contribuirá para a redução da infiltração direta da água no solo.
E esta zona do país já está sujeita a diversas pressões de atividades humanas, que parecem ultrapassar largamente a sua capacidade de as acolher, incluindo ao nível do abastecimento de água e de serviços dos ecossistemas.
c) Fauna e flora - As árvores existentes são um refúgio para a fauna local.
Como é dito no EIA foram identificadas 3 espécies de flora RELAPE (plantas raras, endémicas ou ameaçadas). Por isso apela-se a que mesmo que seja construída a unidade industrial, que seja preservada parte da floresta existente, assim como estes exemplares de flora protegidas.
d) Solo - A implementação de painéis solares gera efeitos erosivos no solo. O próprio solo que vai ser decapado e destruído é outra forma de captura de CO2.
e) Qualidade de ar - As árvores ajudam a manter a qualidade do ar tanto nas próprias instalações industriais vizinhas, como nas localidades próximas.
f) Paisagem. Uma visão estratégica correta para o país é defender o que nos diferencia, neste caso é a protecção do montado, a biodiversidade e a paisagem
g) Economia - Vai perder-se a capacidade produtiva da cortiça que estas árvores iriam fornecer
h) Monitorização - As medidas de compensação preveem a plantação de novos exemplares de sobreiros, mas sem acompanhamento, a taxa de sobrevivência destas novas plantações é reduzida, por isso o GEOTA adverte que caso se proceda ao abate de sobreiros e à plantação de novos exemplares, deve haver o compromisso de monitorização durante um período fixo, de pelo menos uma década ?? para averiguação da mortalidade dos exemplares plantados, e eventual reposição de exemplares que morram.
O sucesso das novas plantações é de cerca de 10% (Teresa Pinto Correia, Universidade de Évora). E plantar novas árvores não substitui o ecossistema que se perde de forma irreversível.
i) Apoio social - Por último, o GEOTA considera que o projeto deve também contribuir para a transição energética nos edifícios e comunidades na sua proximidade, incluindo através do apoio à renovação de edifícios para mitigação da pobreza energética.
Em conclusão, o GEOTA apela à alteração do projecto no sentido de se aumentarem as zonas de floresta a proteger e também a flora classificada.
…………………………………………………………………………………………………………
O GEOTA defende como princípios gerais nos projetos de energias renováveis:
Deve ser sempre privilegiada a instalação em áreas edificadas (urbanas, industriais, serviços), designadamente sobre edifícios, parques de estacionamento, parques de materiais e similares, e em áreas já degradadas ou de baixo valor ecológico e agrícola por forma a não criar conflitos com outros usos;
Não é aceitável comprometer e degradar sítios da Rede Natura 2000 e outras áreas com estatuto de proteção ou valor ecológico, quando estas já têm mecanismos de proteção insuficientes e os compromissos internacionais exigem o seu reforço. A Rede Natura 2000 deve ser liminarmente excluída de projetos industriais, pois não está em causa apenas uma ou mais espécies protegidas, mas sim a salvaguarda e regeneração de habitats e ecossistemas viáveis;
É inaceitável reduzir as áreas florestais. A produção fotovoltaica não pode ser pretexto para a degradação do território e a redução da armazenagem de carbono. Qualquer abate de árvores, deve ser compensado por excesso, com ocupações que garantam a longo prazo uma armazenagem de carbono superior à presente;
Deve ser sempre desenvolvido um plano de partilha de benefícios com as comunidades locais, que preveja a mitigação da pobreza energética na região, por exemplo através da renovação energética de habitações e da instalação de painéis fotovoltaicos no edificado, e que alavanque uma transição energética justa.